And you can't smoke in any of this coffee places...I'm pretty sure coffee was invented by people who were smoking anyways. And they just wanted to invent something so they can stay up late and SMOKE FUCKIN' MORE! That's my theory. Just ask me or Columbo, he'll back me up on this one.» Denis Leary

Thursday, February 28, 2008

Em cada fase da sua vida houvera um café, um lugar que era o complemento da casa, do quarto.

Ana Teresa Pereira

Wednesday, February 27, 2008

Cigarettes and Coffee Blues



Smokin' cigarettes and drinkin' coffee all night long

Tuesday, February 26, 2008

Primeiras horas da manhã. Um Café está sempre à espera. As palavras demoram-se e conversam sobre a mesa usando o espaço do ar para tocar na fala dos outros, contribuindo para criar pelo cruzamento de sílabas, palavras hermafroditas de sentido fragmentário, o idioma do Café.
O burburinho gerado fala uma língua própria somente inteligível pelo empregado de mesa. Vejo-o serpentear pela sala num jogo de decifração, escutando na mesa da frente a resposta à pergunta lançada na mesa anterior, descodificando murmúrios, traço de inconfidências, irreveláveis segredos.
A moeda sob o recibo vai comprar o seu silêncio.

João Luís Barreto Guimarães

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na minha mesa

Outro dia na minha mesa do Santa Cruz estava sentado um casal. Para além de estarem sentados NA MINHA MESA (tive que me sentar na do lado), estavam a destruir o ambiente maravilha do meu café.
A mulher berrava estridentemente, ele escondido debaixo do seu boné mastigava palavras. A certa altura ela sai-se com esta pérola e eu quase que me desmanchei a rir

É sempre a mesma coisa, viró o disco e toco mesmo. O SENHOR É PIOR QUE O TONI CARREIRA.

Saturday, February 23, 2008

a lebre conta um conto

Azeitona

O desagrado latente pela tosta-mista que finalmente se mostrou; as acusações infundadas dela; a solução da azeitona proposta por mim e que ela recusou; as minhas mãos no pescoço insolidário do empregado do snack; a minha redenção comovida face ao compadecimento da autoridade; o desejo de voltar aos dias iguais.

Juro que ela nunca me tinha dado a entender que não gostava de tosta-mista; nunca mo disse explicitamente e, ao contrário do que tem dito por aí, também nunca mo disse implicitamente: nunca me deu os tais sinais óbvios de enfado crescente que acha que eu teria interpretado se não fosse tão «casmurro e in-sensível».
Casmurro e insensível eu, logo eu; eu que me desdobro em cuidados e atenções, a perguntar-lhe a cada dentada, a cada revolução do seu bolo ali-mentar, se a sua tosta-mista estava boa – «a tua tostinha-mistinha está boa, amor?» – e a encorajar-lhe o apetite e o amor-próprio dizendo que «o dono do snack deve ter um fraquinho por ti, amor» por a tosta-mista dela trazer sem-pre mais queijo e fiambre que a minha: «olha tanto fiambrinho, amor»; eu a enchê-la de cuidados e atenções, a enternecer-me com a luz da uma da tarde reluzindo na manteiga dos seus lábios e ela a cair-me em cima com todo o seu desagrado, com todo o seu desamor, dizendo que «uma vez por outra ainda vá» mas que «assim, ritualmente, religiosamente, todos os sábados acabarmos aqui a comer duas fatias de pão aquecido, entremeadas de queijo e fiambre e besuntadas com manteiga, a empurrá-las goelas abaixo com cerveja», que – e subiu o tom de voz – «acabarmos todos os santos sábados neste maldito snack a almoçar uma estúpida tosta-mista» era demais e estava farta – do snack, da tosta e de mim – e eu que revolvia o meu bolo alimentar tentando posicioná-lo para a deglutição e me debatia com o fiozinho de queijo que me ligava o canto da boca à meia-tosta-mista restante no pratinho, engasguei-me.
Ainda roxo, ainda sôfrego, ainda a tossir os bocadinhos de pão que me tinham ido parar aos pulmões, com a luz da uma da tarde reluzindo certamen-te na manteiga dos meus lábios, argumentei que não tínhamos que ir sempre àquele snack – aliás, fora ela quem o escolhera –, que podíamos variar, ir a outro, ir a outros: havia tantos por ali e nalguns a tosta-mista era servida com uma azeitona por cima, espetada num palito. Ela começou a abanar a cabeça e a dizer que não, «não, não», que «a coisa já não vai lá à custa de azeitonas em-paladas» enquanto eu insistia que sim, «sim, sim», que mesmo não ligando nada a mariquices dessas, a paneleirices do género, a pintelhices afins, e mes-mo achando abusivo o acréscimo de preço da tosta-mista quando azeitonada, era o primeiro a admitir que aquilo lhe dava outra graça, a projectava numa direcção estética diferente e que ela ia ver como eu tinha razão. Mas conti-nuou a abanar a cabeça e a dizer que não, «não, não», que eu não estava a per-ceber nada, que «tu nunca percebes nada», que «a nossa relação se tornara numa tosta-mista com manteiga a mais, gordurosa, irrecuperável», corrigindo a seguir tosta-mista para «tosta-monótona» por achar mais apropriado ao nosso caso, e eu que por precaução mantivera a boca vazia, reincidi nas virtudes da azeitona hasteada naquele território de pão e manteiga, no milagroso colorido que dava às coisas todas – aos carros, às casas, aos jardins municipais: à vida de uma maneira geral – e ela a abanar cada vez mais a cabeça – as orelhas a baterem-lhe na cara com grande estardalhaço, como nos elefantes –, a dizer que não «não, não», a abanar tanto a cabeça que me pareceu à beira de se de-senroscar, à beira de sair disparada e cair nalguma das outras mesas do snack onde outros casais almoçavam a sua tosta-mista de sábado, a ronronar o pra-zer da ausência de espinhas, ossos, cascas, escamas, peles e caroços daquela refeição, sem crises, sem dúvidas – a luz da uma da tarde reluzindo na mantei-ga dos lábios de uns e de outros e todos eles acomodados numa felicidade habitual que dispensava a variação de qualquer azeitona. E porque ela não pa-rou de abanar a cabeça e temi que a perdesse e lhe fizesse falta mais tarde – coisas destas acabam sempre por fazer falta mais tarde – tentei segurar-lha: enxotou-me e gritou que não lhe tocasse – «tens as mãos cheias de manteiga» – e aproveitou o balanço para dizer que a minha vida era uma caderneta de cromos repetidos; chamou-me lesma e mosca morta, que todos os meus dias tendiam a ser cópias uns dos outros e que isso não só não me incomodava como era a minha maior ambição – torná-los definitivamente impermeáveis às surpresas – porque tudo o que era diferente me assustava, porque todas as imprevisibilidades me assustavam, que jamais ousaria sequer ir a um barbeiro diferente, a um dentista diferente, a um supermercado diferente, que jamais me atreveria a fazer um caminho diferente de casa para o emprego, do empre-go para casa e, resumindo, que tudo o que não fazia parte da minha limitada lista de hábitos me causava pânico, concluindo logo a seguir que «é melhor acabarmos a tosta antes que o pão esfrie e o queijo solidifique» e depois que era melhor acabarmos o namoro «antes que o respeito que ainda tenho por ti esturre e a minha paciência derreta»: ficou tão satisfeita com este jogo de pala-vras que por uma questão de estilo achou por bem não dizer mais nada – acrescentou apenas que tinha perdido o apetite, levantou-se e saiu do snack e da minha vida, deixando os meus lábios amanteigados a reluzir sozinhos à luz da uma da tarde.
Contei isto assim, como lhe estou a contar a si, senhor guarda, ao empre-gado do snack e ele respondeu-me que não tinha nada a ver com o assunto, que a dor de corno era minha e não dele; mandou-me parar de dar murros no balcão e de falar tão alto porque ainda lhe assustava a clientela: várias fiadas de mesas com casais comedores de tosta-mista debruçados nelas, reflectidos e multiplicados nos espelhos das paredes e do tecto que decoravam o snack, que ali vão há anos, todas as semanas do ano, no mesmo dia da semana e à mesma hora do dia, sem ânsias supérfluas por novidades e que ali ficam como bebés ancorados à paz do seu próprio cheiro numa fralda velha – «a tosta-mista que aqui fazemos é muito boa e não precisa da azeitona para nada». Conferiu pela quantidade de copos vazio à minha frente que eu já devia ter a lucidez a boiar em cerveja: ameaçou não me servir mais nenhuma e foi então que lhe apertei o pescoço.
Admito que devo ter apertado com muita força porque senti qualquer coisa a estalar debaixo dos meus dedos e não eram as minhas falanges. Mas compreenda, senhor guarda, que me achava perdido: uma tosta-mista comida no vazio desolador de um balcão de snack sem um interlocutor de lábios amanteigados onde a luz possa reluzir à minha vista, é um horror indiscritível, uma tragédia irrepresentável mesmo que os actores da companhia sejam tão maus que façam o público chorar logo à partida. E eu já sei que o empregado do snack teve alta, que as radiografias não acusaram nada de grave e que pode voltar ao trabalho já na próxima semana: se ele tiver a gentileza de retirar a queixa estou disposto a ir lá pedir-lhe desculpa e, humildemente, se ele deixar, se ele não se importar, se não lhe causar grande repúdio – mas compreendo se não deixar, se se importar, se o repudiar – sentar-me numa das suas fieis me-sas e retomar o meu hábito antigo: voltar a comer aquela tosta-mista tão apu-rada, feita da mesma maneira há décadas e que, como ele disse e muito bem (desculpe-me a comoção, senhor guarda, tem um lencinho de papel?), não precisa da merda da azeitona para nada.



António Gregório
Uma história de desamor treze vezes

Thursday, February 21, 2008

Um éclair e um millefeuille, por favor

sigo para o balcão para indicar os bolos que pré-paguei, não preciso de apontar, sei os nomes, sei pedi-los com boa pronúncia, uma senhora deve, em qualquer circunstância ser chic , três chic,

Um éclair e um millefeuille, por favor

O empregado não percebe, a língua mais bonita do mundo desperdiçada num empregado ignorante, refaço o pedido, um éclere e um mil folhas, ah, e ele , ah um éclere e um mil folhas


Dulce Maria Cardoso



Duane Keiser

Wednesday, February 20, 2008

Naquele canto do café, junto aqueles homens, ouvindo os mudos conselhos com que a mesa, o divã, os espelhos e todo aquele ambiente intervinham na tertúlia, compreendi que aquilo de que o meu doente precisava era de voltar ao café. A doença dele tinha sido leve, ao princípio, mas perante a ausência de café fora-se agravando sem cessar, devendo agravar-se até à morte caso ele não voltasse ao café. Movido por essa certeza, mandei-o levantar no dia seguinte, ainda com 39º, e fomos instalar-nos no café. Os amigos receberam-no com efusão e contaram-lhe todas as novidades em atraso. Pouco a pouco, e tal como podemos ver andar, visível e invisivelmente, o ponteiro dos grandes relógios de “olho de boi” dos cafés, assim vi eu curar-se o meu doente, voltando gradualmente ao seu estado normal por artes do maravilhoso sanatório que é o café, por influencia desse cosmético de desconhecida receita que é o café dos cafés, por influência do divã, dos espelhos, das luzes, dos amigos, do empregado e de todos os inimitáveis pormenores do sítio.


Ramón Gómez de la Serna

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